2º Festival da Cultura Empreendedora debate impacto social e diversidade nas comunidades empreendedoras

Em edição em formato híbrido, com atividades online e presenciais, evento reuniu 22 convidados na condução das ações e mais de 800 participantes 

“A educação é a única forma de mudarmos todas as estruturas. Precisamos educar para a diversidade”. A frase de Márcia Rocha, empresária, fundadora da TransEmpregos e advogada eleita a primeira Conselheira Seccional trans da OAB/SP (Ordem dos Advogados do Brasil), com assento no Comitê de Direitos Sexuais da World Association for Sexual Health, que participou do painel de abertura, deu o tom da segunda edição do Festival da Cultura Empreendedora.

Promovido pelo Instituto Alcoa entre os dias 22 e 24 de junho de forma híbrida, com atividades online e presenciais nas regiões onde a Alcoa atua - Pará, Maranhão, Minas Gerais, além do escritório de São Paulo -, o evento contou com uma programação composta por oficinas, painéis, rodas de conversas, mentorias, feiras de exposição, além de apresentações culturais.

Especialistas, colaboradores Alcoa, organizações sociais, empreendedores e todos(as) os(as) interessados(as) em dialogar sobre cultura empreendedora puderam refletir sobre “Impacto Social e diversidade: a potência das comunidades empreendedoras”, tema do evento.

Dados sobre o ecossistema empreendedor 

Para entender o cenário, alguns números sobre o empreendedorismo no Brasil:

- A maioria dos empreendimentos em fases iniciais são comandados por mulheres, enquanto negócios mais maduros são capitaneados por homens;

- Mulheres donas de negócio (formais e informais) são mais jovens do que os homens, têm maior escolaridade, mas ganham, em média, 22% a menos que os homens na mesma posição;

- Empreendedores negros já somam 14 milhões no Brasil, setor que movimenta R$ 1,7 trilhão por ano;

- Apesar dos negros comporem cerca de 51% de os empresários brasileiros, esse grupo é o que menos lucra, sendo também 60% dos que não lucram nada;

- Mulheres são donas de apenas 36% das empresas no setor das startups;

- 19,1% das startups não possuem colaboradoras mulheres, mais de 30% não possuem colaboradores pretos, 62% não contam com ninguém de 50 anos ou mais na equipe e mais de 90% não contam com pessoas com deficiência ou transexuais.

- 39,9% dos empreendedores são motivados por necessidade, e não por oportunidade.

Empreendedorismo e diversidade 

O painel de abertura do Festival mostrou que a cultura empreendedora é uma estratégia fundamental para promover inclusão e valorização das diversidades em uma sociedade ainda tão desigual como a brasileira. A mesa foi formada por três empreendedoras: Carolina Ignarra, fundadora do Grupo Talento Incluir; ​Márcia Rocha, fundadora da TransEmpregos e ​Bianca Pedrina, cofundadora do Nós, Mulheres da Periferia. Cada uma falou de inclusão no mundo empreendedor a partir de uma perspectiva diferente: a inclusão de pessoas com deficiência (PCDs), de pessoas trans e de pessoas e, principalmente, mulheres negras. 

Apesar de trajetórias muito distintas, foi possível identificar que, em comum, as três mulheres enfrentaram dificuldades variadas para não só se reconhecerem empreendedoras, mas também como capazes de empreender. Se para Bianca esse autorreconhecimento é um desafio até hoje, que vem acompanhado do racismo e machismo tão presentes nas estruturas sociais, Márcia comenta que se tivesse se assumido trans aos 13 anos, como queria, possivelmente não seria uma empresária. 

Representatividade também foi tema de debate. Enquanto Carolina citou que, quando começou a empreender, mal existiam exemplos de empreendedores com algum tipo de deficiência, Marcia comentou sobre a falta de representatividade em instâncias públicas, sobretudo considerando a diversidade que marca a população brasileira, composta por mais de metade de pretos e mulheres. 

Os impactos da cultura empreendedora 

A parte da tarde do dia 23, que contou apenas com ações online, foi reservada à discussão de dicas para empreendedores e também compartilhamento de experiências. Larissa Novais, diretora da plataforma de financiamento coletivo Benfeitoria; Joyce Venancio, fundadora da organização de impacto social Preta Pretinha e Bia Santos, diretora-executiva da startup de educação financeira Barkus, discutiram como é possível fortalecer o empreendedorismo local a partir de ações individuais e de empresas. 

Investir na educação básica e na formação de professores, comprar de pequenos produtores, fazer pesquisas de mercado, ouvir o que diferentes grupos têm a dizer sobre suas maiores dificuldades e demandas, abrir as portas do ecossistema empreendedor para novos membros e investir na conscientização e compreensão sobre o poder da união de esforços, além da atuação em rede em iniciativas como campanhas de financiamento coletivo foram algumas dicas discutidas. 

No Banco de Práticas, três empreendedores, um de cada localidade, compartilharam suas experiências. Márcia Freitas, empreendedora apoiada pelo projeto Elas por Elas e participante da Rede Asta de Poços de Caldas (MG) participou da confecção de máscaras durante a pandemia e contou que, o empreendedorismo, mesmo surgido em meio à necessidade, a fez crescer. 

Jefferson Taylor, responsável pelo Projeto Circuito de Empreendedorismo da Diversidade da Associação Folclórica Bumba Meu Boi de Orquestra Lendas e Magias do Centro Histórico de São Luís (MA), comentou sobre os benefícios da formalização dos empreendedores e como passou esse conhecimento adiante visitando diversos bairros de São Luís. 

Thatiana Andrade, artesã, professora de balé e integrante do projeto Dona's, comenta sobre a convivência com outras profissionais e a possibilidade de troca de experiências como ponto alto de sua participação no projeto, que, segundo ela, transformou sua vida. 

A última atividade do dia 23 foi dedicada à apresentação dos colaboradores Alcoa e representantes das comunidades, que dividiram seus talentos artísticos. Mizael Monteles, colaborador ALUMAR e cantor amador, apresentou uma música tradicional das festividades do Bumba meu Boi. Patrick Oliveira, trouxe melodias autorais direto de Minas Gerais e Andrailton Silva de Oliveira, de Juruti, gravou um vídeo especialmente para o Festival. Confira aqui. 

Vozes do Campo 

→ Falta de representatividade 

“Quando olhamos para [os poderes] Executivo, Legislativo e Judiciário, ou para empresas bem sucedidas, vemos geralmente homens brancos, heterossexuais, de classe média alta, que estudaram em escolas particulares a vida inteira e cursaram inglês desde pequenos nas posições de poder, em um dos países mais diversos do mundo, que conta com mais da metade da população formada por pessoas negras e mulheres. Algo está errado, não é? Nós precisamos rever nossas estruturas e valores para privilegiar a sociedade toda, porque atualmente 90% da população é excluída de ter verdadeiras oportunidades de inclusão social.” 

​Márcia Rocha | fundadora da TransEmpregos

“A autoestima é uma questão muito importante na vida do indivíduo, principalmente na fase infantil. A partir de tudo que foi passado para nós na infância, eu e minhas irmãs nos amávamos enquanto garotas negras, mas faltavam bonecas negras no mercado e, quando tinham, eram bonecas estereotipadas, com aspectos que não nos representavam.”

Joyce Venancio | fundadora da organização de impacto social Preta Pretinha

→ Pertencimento 

“Antes do acidente, eu dava aulas em grandes empresas como professora de educação física. Depois do acidente, voltei a trabalhar nos bastidores. Eu tinha certeza que quando chegava de agasalho para dar aula, as pessoas participavam por conta do rótulo de ‘coitadinha’, com um olhar de piedade. Mas ao invés de me apegar a isso, usava esse ‘chamariz’ e me esforcei para dar boas aulas para que todos vissem que eu era tão competente como os outros professores.”

Carolina Ignarra | fundadora do Grupo Talento Incluir

“Quando falamos de empresas maiores, não necessariamente são levadas em conta questões como mulheres com dupla jornadas, mulheres que são mães. São diversos atravessamentos. É necessário muita coragem para disputar esses espaços, porque quando você nasce mulher preta, todo mundo te diz que você não tem direito a esses espaços de poder, como a mídia.” 

Bianca Pedrina | cofundadora do Nós, Mulheres da Periferia

“Eu tenho orgulho de falar que esse projeto transformou a minha vida. Eu quero sempre estar junto de pessoas de sucesso, como aqui no evento, ouvindo histórias inspiradoras. O mundo dos negócios e do empreendedorismo está cheio de riscos, mas a gente tem que enfrentá-los. Precisamos ter coragem para nos reinventar a cada dia.”

Thatiana Andrade | artesã e professora de balé, integrante do projeto Dona’s, que atua com pequenas empreendedoras  (Juruti - PA)

→ Transformação

“O Elas por Elas caiu como uma luva, quando conheci cerca de 40 mulheres. O meu trabalho, no empreendedorismo, veio da necessidade, mas a oportunidade me fez crescer. Essa remuneração foi muito importante para mim, além de produzir um material tão essencial para a saúde das pessoas. Fiquei muito lisonjeada.” 

Márcia Freitas | empreendedora apoiada pelo projeto Elas por Elas e participante da Rede Asta (Poços de Caldas - MG) 

→ Parcerias 

“As pessoas trans têm dificuldades, por exemplo, para entrar no programa de Microempreendedor Individual (MEI) [por conta do nome social]. Já fomos a seis bairros em São Luís para falar do MEI, e fizemos uma parceria com o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), que foi muito importante para ajudar as pessoas a se formalizarem. Muitos não sabiam a importância dessa questão.” 

Jefferson Taylor | responsável pelo Projeto Circuito de Empreendedorismo da Diversidade da Associação Folclórica Bumba Meu Boi de Orquestra Lendas e Magias do Centro Histórico (São Luís - MA)

→ Potencial da educação 

“Fui influenciada por professores-mentores em uma escola pública durante o ensino médio. A educação básica é estruturante para conseguirmos evoluir o ecossistema empreendedor. Precisamos conversar com educadores para eles serem essa ponte de contato com seus alunos no processo da educação empreendedora.”

Bia Santos | diretora executiva da start up de educação financeira Barkus

→ Engajamento e identificação com causas 

“Quando uma campanha de financiamento coletivo é bem estruturada e bem planejada, há um potencial de disseminação, porque 50% das pessoas que entram na página de uma campanha, ajudam a divulgá-la. Nesses casos as pessoas não doam porque são legais, elas doam porque acreditam e vestem a camisa, porque querem fazer parte.”

Larissa Novais | diretora da plataforma de financiamento coletivo Benfeitoria

Atividades presenciais 

Além das atividades online realizadas no dia 23, o Festival também contou com ações presenciais. 

Em Juruti (PA), o Festival começou cedo, no dia 22, com uma mesa de abertura sobre como alavancar o empreendedorismo na região; uma roda de conversa com empreendedores sobre iniciativas de alimentação, agricultura e artesanato; uma oficina de educação digital para o empreendedorismo; e, também, a realização de uma feira de exposição de produtos locais na Alcoa Juruti. 

Já os municípios de São Luís (MA) e Poços de Caldas (MG) realizaram ações no dia 24 de junho. Em São Luís, voluntários Alumar se encontraram e trocaram experiências com empreendedores comunitários da região que fazem parte do Projeto Feirinha da Gente, iniciativa local promovida por colaboradores em alinhamento com a frente de Geração de Trabalho e Renda do Instituto Alcoa. 

Em Poços, as ações foram divididas entre online e presenciais. O primeiro momento do dia foi reservado a uma roda de conversa para discutir modelos de empreendedorismo social com empreendedores locais. A localidade também contou com um estande onde empreendedores puderam divulgar seus trabalhos. Para encerrar o dia, foi ministrada uma palestra sobre marketing digital.